Representante da FAO afirma que o Brasil será uma potência técnico-agrícola

Vanessa Kannenberg

Para Alan Bojanic, a agricultura familiar é parte da solução para o problema da fome


Bojanic prometeu voltar ao Estado para visitar a Expointer, em Esteio 

À frente do braço da Organização das Nações Unidas (ONU) para agricultura e alimentação (FAO) no Brasil, Alan Bojanic conversou com Zero Hora quando passou pela Expoagro, em Rio Pardo, em março. 

Falou sobre a agricultura familiar - principal tema de trabalho da FAO neste ano - e sobre outros assuntos relacionados ao agronegócio. E Bojanic promete voltar ao Estado para visitar a Expointer, em Esteio. 

Zero Hora - A FAO nominou 2014 como o Ano da Agricultura Familiar. Qual a razão? Há alguma preocupação específica com a atividade no futuro? 

Alan Bojanic - A agricultura familiar é parte da solução para o problema da fome. Não só por produzir alimento para as cidades, mas também porque parte da fome é nas áreas rurais. Procuramos fortalecer a agricultura familiar com programas de desenvolvimento rural e sustentável para gerar renda e encontrar oportunidades para erradicar a fome também nas áreas rurais. A sinergia entre produção de alimento, geração de renda e desenvolvimento sustentável nas zonas rurais é parte importante dos esforços da FAO. A subsistência e o aumento de renda do produtor não são excludentes: precisamos que gerem renda e tenham oportunidade de emprego para melhorarem sua condição de vida. Nesse sentido incentivamos a agricultura urbana, para que as pessoas, na cidade, também possam ter à sua disposição alimentos saudáveis e produzidos por elas mesmas. 

ZH - O Rio Grande do Sul tem quase a totalidade de sua produção de soja baseada nos transgênicos. Pelo ganho de produtividade, a tecnologia é apontada por parte dos especialistas como forma de reduzir a fome mundial. Qual a posição da FAO sobre alimentos geneticamente modificados? 

Bojanic 
- Não temos uma posição única sobre transgênicos. A FAO é uma organização que tem, na diretiva, países que são a favor e países que são contra. É um tema muito polêmico. E como a FAO não é independente, mas dependente dos países, e eles estão divididos, optamos por ficar numa posição de neutralidade sobre esse tema. Existem posições muito fortes por possíveis problemas de saúde que podem gerar e, de outro lado, quem valoriza o aumento de produtividade. O que é certo é que precisa de muita pesquisa ainda, muito estudo e fundamentação. É um debate que não é para se encerrar logo. É um debate que se tornou mais político do que técnico. Virou um debate de posições e não de argumentos, como deveria.

ZH - Sobre o uso de grãos para produção de biodiesel, como a FAO se posiciona? Alguns alegam que uso de grãos para produção de energia ajudaria a aumentar a fome no mundo. 

Bojanic
 - Nós somos a favor dos bicombustíveis, promovemos a sua produção e uso porque mesmo a agricultura precisa de energia. O mundo do futuro não pode ser pensado sem um aumento na capacidade de produção de energia, principalmente energias limpas. E os biocombustíveis são importantes também na geração de renda dos produtores e para evitar custos. Por exemplo, o uso de biogás a partir do esterco do gado é algo que ajuda muito os agricultores a não ter que comprar gás, a ter iluminação, ajuda a cozinhar e outras coisas. E é uma forma de reciclar a energia. Quanto aos tipos de culturas usadas na produção de bicombustíveis, o que é importante para nós e o que tentamos promover são as culturas de alto rendimento por hectare. Por exemplo, com a palmeira africana, você pode produzir até cinco toneladas de bicombustível por hectare. Se você vai comparar isso com a produtividade da soja, que é muito menor, é preferível usar culturas de mais rendimento para produzir energia e deixar outras com menos, como a soja, para alimentação. Em resumo, temos de ter culturas energéticas, mas temos de optar por aquelas que não vão competir com a produção de alimentos. 

ZH - O Rio Grande do Sul tem parte de sua economia baseada no plantio do tabaco. A FAO defende, para diferentes atividades, o sistema de integração de culturas. Esse é o futuro do tabaco no mundo? 

Bojanic - A FAO não tem relação direta com o tema da produção de tabaco, mas não somos contra esse tipo de plantio. É uma fonte tradicional e importante de renda para a agricultura familiar em diferentes países. Mas é importante vermos formas de diversificação de culturas, dar opções aos agricultores. Mas têm de ser opções de rentabilidade, que possam competir com os lucros que o fumo gera. É uma questão mais do produtor de tomar a decisão e buscar culturas diferentes e que possam lhe dar renda. Pode ser cultura alimentícia ou qualquer outra, até mesmo o tabaco energético (pesquisas buscam outros usos para o tabaco, como para a produção de biocombustíveis a partir de uma variedade que tem alto volume de sementes, das quais é extraído óleo. No país, há três lavouras experimentais, uma delas em Rio Pardo). O importante é procurar algo que dê uma vida digna para quem vive da produção rural.

ZH - O Brasil é um dos celeiros do mundo e bate recordes de produção. Basear a agricultura nas exportações é um bom negócio? 

Bojanic
 - O Brasil tem muito espaço para crescer com o aumento da demanda por alimentos. China e Índia, por exemplo, estão com uma classe média crescente e que vai precisar de alimentos. O Brasil é um dos países que pode suprir essa demanda por suas condições de produtividade e, sobretudo, de conhecimento. Sempre digo que o Brasil não é só uma potência exportadora. O Brasil vai ser uma potência em conhecimentos técnico-agrícolas. O Brasil tem feito muito em termos de desenvolver conhecimento, pela Embrapa, universidades e instituições de pesquisa. Conhecimento é uma forma de se obter renda para o país, exportando tecnologia, maquinário, insumos agrícolas, e de contribuir para que países menos desenvolvidos também possam evoluir e produzir alimentos.

Fonte

CNA-SENAR

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