Se as plantas transgênicas já eram utilizadas na alimentação humana e animal e para a geração de bioenergia, agora elas também poderão servir de fonte para a produção de medicamentos. Isso é o que mostram pesquisas da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen), realizadas em parceria com instituições nacionais e estrangeiras, como o Instituto de Saúde dos Estados Unidos (NIH) e o Instituto do Câncer de Nova York. Em diversos estudos, a soja geneticamente modificada é utilizada como biofábrica para obtenção de moléculas empregadas em fármacos contra doenças como a AIDS, e alguns tipos de tumores, como os de mama, colo de útero e esôfago.
De acordo com o pesquisador do Cenargen, Elíbio Rech, a produção das moléculas cianovirina, contra o HIV, e NY-ESO e GAGE, contra o câncer, são importantes para a fabricação comercial de medicamentos. Para isso, uma boa alternativa é a geração do material em soja transgênica, em vacúolos que acumulam proteínas. “Basicamente o que fazemos é uma simples substituição genética para que, ao invés de fabricar a beta conglicinina, a planta elabore uma molécula específica contra o câncer, HIV ou outras doenças”, explica Rech.
A soja transgênica desenvolvida pela Embrapa contém, por grão, aproximadamente 20 miligramas de anticorpos contra o HIV e é capaz de gerar, em média, quatro quilos desses anticorpos por hectare de soja. Para Rech, a produção em larga escala de moléculas em vegetais transgênicos é mais barata, devido à redução do custo de fabricação da matéria-prima contendo proteínas recombinantes. Outra vantagem é que as plantas não estão sujeitas à contaminação por organismos causadores de doenças em humanos, o que evita gastos com purificação contra vírus e bactérias. “A expectativa é que os medicamentos resultantes dessas pesquisas cheguem às mãos de médicos e farmacêuticos com o menor preço possível”, diz Rech
Alternativa vegetal
Atualmente, moléculas para o uso farmacêutico são obtidas apenas por meio do cultivo de células em animais ou em bactérias. Por isso, o uso de culturas vegetais pode ser uma alternativa eficiente para atender à demanda de fabricação de medicamentos. “No futuro, serão necessárias tecnologias capazes de produzir proteínas recombinantes com diferentes características, e precisaremos de mais do que dois sistemas de produção. É aí que a planta entra como uma biofábrica muito importe”, afirma Rech.
Segundo o pesquisador, existem outras culturas, como o tabaco, o milho, o arroz e a cevada que já são estudadas para o uso farmacológico, o que pode impulsionar a cadeia produtiva agrícola. “As novas aplicações farmacêuticas para essas plantas valorizam o agronegócio porque expandem as possibilidades para outros setores produtivos”, avalia.
Novo uso para o glifosato
No Instituto Biológico, em Campinas (SP), um estudo realizado com a pulverização de glifosato nas culturas de soja e milho mostra que ele também pode ser aplicado com finalidades farmacêuticas. Para o pesquisador da instituição e coordenador do projeto, Marcus Barifouse Matallo, a aplicação do herbicida possibilita a obtenção de maiores concentrações de ácido chiquímico nas plantas. A substância é o composto inicial para a produção do Tamiflu, usado no tratamento das gripes tipo A e aviária, causadas, respectivamente, pelos vírus H1N1 e H5N1. “O índice de mortalidade dessas doenças é muito alto e as vacinas não são 100% eficazes, principalmente em idosos. Por isso, esse trabalho tem importância para a sociedade e para o ser humano”, afirma Matallo.
Quando aplicado nas plantas, o glifosato cria um mecanismo de ação que inibe uma enzima no vegetal, conhecida como EPSPS, e que provoca um aumento de concentração do ácido chiquímico de até 969% no milho e 33000% na soja. Para Matallo, as culturas podem servir como fonte alternativa para a obtenção da substância, que atualmente é encontrada apenas na planta anis-estrelado (Illicium verum), restrita a uma região específica da China. “Em caso de uma epidemia ou pandemia desses tipos de gripe, não existe quantidade de matéria-prima suficiente para a produção do Tamiflu”, ressalta.
Segundo o pesquisador, o projeto é desenvolvido em escala laboratorial e ainda é cedo para se pensar em uma produção industrial de ácido chiquímico. “Esse é um começo, mas, se o processo for viável, a demanda pela substância poderá ser completamente atendida”, avalia Matallo. Devido ao seu potencial econômico e para a saúde humana, o estudo ganhou a segunda colocação na categoria “Pesquisador” do Prêmio Agroambiental Monsanto, que reconhece trabalhos de estudantes e pesquisadores brasileiros para o desenvolvimento de uma agricultura sustentável.
Fonte: Monsanto
Você precisa ser um membro de AgroRede para adicionar comentários!
Entrar em AgroRede