Governo envia ao Congresso proposta sobre comércio de produtos com base em plantas e animais

A presidente Dilma Rousseff encaminhou ontem (20/06/14) ao Congresso Nacional uma mensagem com um projeto de lei que regulamenta o acesso e a repartição dos lucros econômicos dos bens naturais brasileiros, os chamados recursos genéticos.


Polêmica, a proposta a que O Globo teve acesso com exclusividade diz que empresas que quiserem obter os conhecimentos detidos pelos povos tradicionais e comunidades indígenas devem obter a autorização dos mesmos por meio de uma assinatura, de um registro audiovisual, de um parecer do órgão oficial competente (não explicitado no texto), de adesão de um protocolo comunitário ou de um laudo antropológico. Empresas estrangeiras também poderão acessar o material brasileiro.

Alguns setores do governo questionam, por exemplo, se a assinatura de um laudo antropológico asseguraria o consentimento dos detentores de tal conhecimento. Quando a origem do conhecimento tradicional não é identificada, fica suspensa a necessidade de autorização. O projeto foi apresentado ontem em coletiva de imprensa pelos ministros Izabella Teixeira (Meio Ambiente), Clelio Campolina (Ciência, Tecnologia e Inovação) e Mauro Borges (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior).

Aprovada pelo Congresso, a lei autorizará empresas a coletarem, enviarem ao exterior e comercializarem produtos feitos a partir de plantas, raízes, frutos encontrados na natureza. A lei também franquia acesso e permite o envio de amostras da fauna brasileira, inclusive de espécies domesticadas.

Aos povos tradicionais detentores do conhecimento sobre o potencial medicinal, alimentício ou cosmético do recurso genético a lei garante o recebimento de benefícios que podem ser econômicos ou não da venda dos produtos comercializados pela empresa que se apoderar dessa sabedoria popular. Micro e pequenas empresas estariam liberadas de dividirem com os donos do conhecimento os lucros da venda dos produtos.

Embora não explicite como isso será feito, o projeto do governo também diz que os donos do conhecimento participarão do processo de decisão sobre como se dará o acesso ao material e a repartição da verba arrecadada com a venda dos produtos.

O acesso ao conhecimento tradicional, ao material genético e o envio desse material ao exterior deve ser cadastrado. Haverá uma regulamentação dessa norma e a disponibilização do cadastro na Internet.

A nova lei, se aprovada, também prevê multas para quem descumpri-la. No caso de empresas, o valor da multa pode chegar a R$ 10 milhões. Na seção de disposições transitórias, o texto do projeto de lei fala em dar um desconto de 90% nas multas já aplicadas com base na Medida Provisória nº 2.186-16, de 2001.

Críticas ao projeto

A proposta é questionada por integrantes do governo que participaram das reuniões de elaboração do texto. Uma das críticas é que o projeto favorece a indústria farmacêutica em detrimento dos donos do conhecimento. Durante as discussões, a indústria teria sido ouvida amplamente, enquanto que ONGs e representações de povos indígenas e tradicionais não teriam sido consultados suficientemente.

Outro ponto que pode dar problema é o excessivo poder dado ao Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), ligado aoMinistério do Meio Ambiente (MMA), em detrimento do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) cuja participação não consta da proposta. Caberá ao CGEN, por exemplo, permitir o ingresso e a coleta de material em área pública quando houver relevante interesse público.

As regras que atualmente regem o acesso ao conhecimento tradicional de recursos genéticos e comercialização de produtos feitos com base nele constam de uma Medida Provisória, que terá validade enquanto o texto do projeto de lei não for aprovado pelo Congresso.

O projeto também cria o Fundo Nacional de Repartição de Benefícios e o Programa Nacional de Repartição de Benefícios.

Esse assunto foi objeto de um acordo internacional assinado pelo Brasil e outros países na última Convenção sobre Diversidade Biológica, o chamado Protocolo de Nagoya. O protocolo ainda não foi ratificado pelo Brasil.

FONTE

O Globo
Catarina Alencastro

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