Cultivada inicialmente apenas no Sul do Brasil, a soja foi a primeira cultura a impulsionar o desenvolvimento agrícola do Cerrado, a partir da década de 1970. Hoje, a agricultura no Bioma é responsável por mais de 60% da produção total da leguminosa no Brasil – 90,3 milhões de toneladas na safra 2013/2014, na previsão da Conab. A produtividade média (3,04 toneladas/hectare) supera a nacional (2,64 toneladas/hectare), segundo dados do IBGE.
Boa parte da história da tropicalização da soja no País foi escrita pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e seus parceiros, que juntos direcionaram tecnologias e esforços para o melhoramento genético da soja visando à adaptação da cultura às condições ambientais da savana brasileira. O trabalho de pesquisa e desenvolvimento é sistematizado pelo programa de melhoramento genético de soja da Embrapa, que tem a liderança nacional da Embrapa Soja (Londrina, PR), com participação da Embrapa Produtos e Mercado (Brasília, DF). Mas o braço para o desenvolvimento de cultivares para as diferentes regiões do Cerrado brasileiro é a Embrapa Cerrados (Planaltina, DF). Instalada no coração do Bioma, o centro de pesquisa é um importante protagonista da expansão da soja na região. Dos campos experimentais de Planaltina já foram lançadas cerca de 50 variedades nos últimos 30 anos. Atualmente, o portfólio de cultivares de soja para o Cerrado conta com nove materiais convencionais e três transgênicos (RR), desenvolvidos em parceria com as fundações Cerrado e Bahia. As entidades são mantidas por empresas sementeiras, que aportam recursos orçamentários e mão de obra, tendo em contrapartida a exclusividade de venda das sementes no mercado. A gestão da parceria é compartilhada entre a Embrapa Cerrados e as fundações, o que garante melhor acompanhamento dos planos de trabalho e de transferência de tecnologia, pactuados anualmente. A abrangência de adaptação das cultivares vai do Noroeste mato-grossense ao Centro-Oeste mineiro e Oeste baiano. Para a próxima safra (2014/2015), devem ser lançadas cinco novas cultivares, incluindo materiais com os eventos de transgenia Cultivance e Intacta (com RR e Bt). Os produtos buscam atender às novas demandas dos produtores e às exigências dos mercados nacional e internacional de soja. A perspectiva é de que nos próximos anos sejam lançadas variedades com outros eventos de transgenia que facilitem o controle de ervas daninhas e insetos-praga. “É um programa grande e crescente em abrangência e lançamentos”, aponta o pesquisador Sebastião Pedro, que coordena os trabalhos na Embrapa Cerrados. A equipe conta com 20 colaboradores, entre empregados da Unidade e trabalhadores contratados pelas fundações parceiras, que atuam em praticamente todas as fases do desenvolvimento das cultivares. Nos ensaios de competição realizados nos campos experimentais do centro de pesquisa e em outros 25 locais de ensaios regionais espalhados pelos Cerrados de Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Bahia, Minas Gerais, Roraima e Amapá, são selecionados materiais com estabilidade e ciclo adequado às condições de cada região. Também são realizados estudos de fitotecnia, conduzidos pelo pesquisador André Pereira, para avaliar o comportamento dos materiais quanto a arranjo de plantas e populações, entre outros aspectos. Sebastião explica a vantagem de os campos experimentais da Unidade estarem situados no coração do Cerrado: “É a região que, na média, mais se parece com as outras do Bioma. É por isso que a chance dos materiais testados aqui darem certo em outras regiões é grande. Temos confirmado isso nos outros locais de teste”. Ele acrescenta que o programa de melhoramento conduzido pela Embrapa Cerrados é diferente dos demais. “Não trabalhamos apenas com genética, mas com genética e ambiente”. As linhagens que darão origem às novas cultivares devem alcançar maiores tetos de produtividade, sem abrir mão da multirresistência a nematoides e fungos do solo e da arquitetura de planta que favoreça o manejo da cultura. “Para lançar um produto competitivo, é preciso ter visão. Não podemos errar, pois uma cultivar leva até 14 anos de pesquisa para ser desenvolvida”, aponta o pesquisador. Evolução Nos últimos cinco anos, as ações do programa de melhoramento genético de soja no Cerrado foram substancialmente ampliadas. Se na safra 2009/10 os locais de teste eram apenas cinco, na atual (2013/14) são 25, aumentando o raio de atuação de 800 quilômetros para 2 mil quilômetros. Os ensaios de competição (primários e finais) contavam com 17 mil parcelas, e em 2013/14 são 47 mil, o que representa incremento de quase 300%. Em 2009/10, a equipe percorria 1,8 mil quilômetros para conduzir os ensaios, sendo que na atual safra perfaz 7,5 mil quilômetros no Distrito Federal e nos estados de Goiás, Mato Grosso, Tocantins, Minas Gerais e Bahia. Já os ensaios em rede (conduzidos pelos parceiros), antes apenas oito, hoje são 33. Nos campos experimentais, os cerca de 100 hectares atuais de experimentos com soja representam o dobro da área de 2009/10. Fora da Unidade, as áreas de ensaios somam 52 hectares, entre ensaios de valor de cultivo e uso (VCU), multiplicação de inverno, unidades demonstrativas e unidades de observação especial. “É um trabalho muito particular, e muito bem conduzido pela equipe. A cada ano, a confiança dos nossos parceiros aumenta”, diz o pesquisador Sebastião Pedro. Em todo o programa de melhoramento de soja, são cerca de 500 profissionais envolvidos em diversas Unidades da Embrapa e instituições parceiras. O pesquisador ressalta a importância da parceria público-privada que tem dado sustentação ao programa. Ele explica que, muito além de competir no mercado de cultivares de soja, o principal legado do trabalho é possibilitar a oferta de sementes de alta qualidade genética a um custo mais baixo para o produtor, que paga o equivalente entre 3 kg a 8 kg por saco de semente em royalties. “O papel da Embrapa é fornecer tecnologia. Quem produz a semente Embrapa está contribuindo para manter o preço em equilíbrio no mercado. Isso permite a sustentabilidade do agronegócio brasileiro”, observa. Aprovação pelos parceiros Em visita aos experimentos na Embrapa Cerrados em janeiro, diretores e representantes de empresas sementeiras que compõem a Fundação Cerrados conheceram materiais precoces e superprecoces, convencionais e transgênicos com potencial para lançamento nos próximos anos agrícolas. Os principais mercados dessas empresas são Mato Grosso, Bahia, Tocantins, Maranhão, Piauí e Goiás. “Não havia materiais atualizados. Hoje, o mercado busca cultivares com tipo de crescimento indeterminado, arquitetura mais ereta e mais precoces. O programa com a Embrapa está se encaixando nesse perfil. Esperamos enquadrar muitos materiais”, disse o diretor técnico da Fundação Cerrados, Ilson Alves. “Tem material pronto para ser lançado e que deve entrar bem no mercado, inclusive no Sudoeste goiano, onde estávamos carentes de variedades”, acrescentou. Os materiais que mais chamaram a atenção dos sementeiros aliam arquitetura ereta de planta a maior precocidade, elevado teto produtivo e resistência a doenças. “É o que o mercado quer”, disse João Batista Viana, técnico da Produtiva Sementes, de Formosa (GO). Stênio Rapachi, da Sementes MR, de Luziânia (GO), lembrou que os materiais da Embrapa eram largamente comercializados no País até a chegada do evento RR, quando perderam mercado. “Com a arquitetura moderna de planta desenvolvida no programa de melhoramento, está começando a crescer a demanda de sementes da Embrapa. Há materiais novos que são bastante promissores”, disse. A empresa multiplica sementes Embrapa em cerca de 600 hectares. “A perspectiva de aceitação para os materiais que estão vindo é boa, principalmente os que visam ao mercado do Mato Grosso”, completou. Segundo os sementeiros, a demanda para aquele Estado é de cultivares convencionais para o período de safra e de transgênicas para a safrinha. Hugo Moreira, que trabalha com o sementeiro Luiz Vicente Ghesti, ainda não associado à Fundação Cerrados, também percebeu a evolução dos materiais da Embrapa. “Está muito interessante. A linha de trabalho atual e o material que a Embrapa vem desenvolvendo é justamente o que o mercado procura. Agora é elaborar uma estratégia de marketing para atingir esse mercado”. Sebastião Pedro lembrou que a parceria com a Fundação Cerrados é essencial para o programa de melhoramento de soja. “Ela permite que a Embrapa coloque à disposição da sociedade variedades ajustadas para atender aos produtores brasileiros. E possibilita que o trabalho de pesquisa e de mercado ocorra de forma célere e competitiva, no momento certo”, afirmou. O pesquisador enfatizou que a opinião dos parceiros sobre quais materiais devem ser desenvolvidos e lançados é fundamental. “Procuramos trazer a visão do mercado para dentro da ciência. Por isso, conhecer a visão do parceiro sementeiro é de fundamental importância”. Rusticidade e produtividade
Conheça o portfólio atual de cultivares de soja da Embrapa para o Cerrado: Convencionais BRS 7580 – potencial produtivo com estabilidade; precocidade (ideal para o sistema soja/milho safrinha); resistente ao nematoide de cisto (raças 1 e 3); pouco exigente em fertilidade de solo; tolerante ao vírus da necrose da haste. BRS 7980 – potencial produtivo com estabilidade; resistente ao nematoide de cisto (raças 1,3 e 4) e aos nematoides de galha (M. javanica e M. incognita); permite safrinha de milho e algodão em Mato Grosso. BRS 8381 – altíssimo potencial produtivo com estabilidade; hábito de crescimento ereto, arquitetura arejada, auxiliando no controle das principais doenças (ferrugem e mofo branco) e lagartas; resistente a M. javanica. BRS 8480 – potencial produtivo com estabilidade; baixo fator de reprodução de Pratylenchus brachyurus; resistente a M. javanica. BRS 8580 – potencial produtivo com estabilidade. BRS 8780 – alto potencial produtivo com estabilidade; resistente aos nematoides de galha (M. javanica e M. incognita). BRS 313 (Tieta) – pode ser semeada em toda época recomendada (novembro e primeira quinzena de dezembro); plantio no início da safra permite uma segunda cultura no mesmo ano; alto potencial de rendimento. BRS 314 (Gabriela) - pode ser semeada em toda época recomendada (novembro e primeira quinzena de dezembro); alto potencial de rendimento. Transgênicas (RR) BRS 8180RR - potencial produtivo com estabilidade; alia os benefícios do Roundup Ready® a resistência aos nematoides de galha (M. javanica e M. incognita); permite safrinha em Mato Grosso; tolerante ao vírus da necrose da haste. BRS 8280RR – potencial produtivo com estabilidade; alia os benefícios do Roundup Ready® a resistência aos nematoides de galha (M. javanica e M. incognita); permite safrinha em Mato Grosso. BRS 9080RR – sanidade foliar; potencial produtivo com estabilidade; alia os benefícios do Roundup Ready® a resistência aos nematoides de galha (M. javanica); desenvolvida sob medida para regiões sojícolas da Bahia e do Mato Grosso. Futuros lançamentos Cultivares RR superprecoces, além de cultivares com os eventos de transgenia Cultivance e Intacta.
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