Quando a ferrugem do café atacou as plantações das encostas desta cidade do tempo dos maias, a doença foi devastadora, reduzindo os cafeeiros a nada mais que gravetos cinzas.
Román Lec, 65, que cultiva café em alguns hectares, perdeu metade de sua colheita em 2013. Neste ano, ele fez um empréstimo de US$ 2.000 (R$ 4.420) para comprar fertilizante e fungicida para proteger os cafeeiros, como fez no ano passado. Mas a doença voltou, e seu prejuízo foi ainda maior. 
"Há noites em que não consigo dormir, pensando em como eu vou pagar o empréstimo", disse Lec. 
O fungo é chamado ferrugem do café, ou "la roya", em espanhol, e se alastrou pela América Central, matando cafeeiros, reduzindo a produção drasticamente e deixando consequências que se propagam pelas economias locais. 
Os grandes produtores contratam menos trabalhadores para colher os frutos vermelhos que encerram os grãos. Produtores menores se endividam e vendem gado ou ferramentas. As vendas do comércio local caem. 
Adolescentes abandonam a escola para trabalhar na plantação, porque seus pais não têm mais condições de contratar empregados de fora. No final da cadeia estão os trabalhadores migrantes sem-terra que ganham apenas um punhado de dólares por dia. 
"Se você considerar todas as pessoas ligadas ao café, é um problema muito sério", comentou Roberto de Michele, do Banco Interamericano de Desenvolvimento. 
Forest e Kim Starr/Creative Commons
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O café do tipo arábica; fungo se alastrou por plantações e devasta cafezais na Guatemala
A ferrugem do café se espalhou rapidamente e muito, fomentada pelas temperaturas mais altas que permitem que o fungo se desenvolva em altitudes maiores. Para muitos especialistas, as mudanças climáticas são as grandes culpadas pela expansão da praga. 
Depois de anos com o preço do café em baixa, os pequenos produtores não puderam substituir os cafeeiros envelhecidos, mais vulneráveis ao ataque da ferrugem. 
"Não havia nada que impedisse o avanço da ferrugem, porque as plantações estavam em péssimo estado", disse Maja Wallengren, especialista em café, no México. 
O problema que ocorre aqui é apenas um dos vários fatores para a alta do preço do café nos mercados globais de commodities. 
A alta do preço pode chegar aos supermercados e cafeterias que vendem o café arábica de alta qualidade da América Central. 
Desde novembro, os preços do café subiram entre 70% e 80%, principalmente devido à seca no Brasil, maior produtor mundial. 
Quatro milhões de pessoas na América Central e sul do México dependem do café para sua subsistência, segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento. 
O presidente da Associação Nacional do Café da Guatemala (Anacafé), Nils Leporowski, disse que cerca de 100 mil empregos ligados ao café desapareceram. 
"A ferrugem expôs a profundidade dos problemas sociais e econômicos da vulnerabilidade da população ao mercado e às mudanças climáticas", comentou Peter Loach, diretor para a Guatemala da ONG Mercy Corps. 
Anne Valando, do Programa Mundial de Alimentos, estimou que 300 mil guatemaltecos podem precisar de ajuda alimentar. 
No esforço para combater a doença, os produtores pulverizam fungicida, substituem ou podam cafeeiros velhos e controlam as árvores de sombra que filtram a luz solar e parecem reduzir a disseminação da ferrugem. 
A epidemia atual de ferrugem do café começou em 2011. O volume da colheita de 2013 diminuiu 15% na Guatemala, e países vizinhos tiveram perdas semelhantes ou maiores. Neste ano, a expectativa é de redução de 10%, de acordo com as cifras de exportação. 
O setor cafeeiro está intensificando seus esforços para produzir variedades resistentes à ferrugem e ao calor. Mas, segundo Leonardo Lombardini, da Pesquisa Cafeeira Mundial na Universidade Texas A&M em College Station, os híbridos podem levar 30 anos para chegar aos produtores. 
"O problema é que os produtores estão tendo dificuldades e, ao mesmo tempo, o clima muda em ritmo acelerado. A janela de condições climáticas para o café tipo arábica é relativamente estreita." 
Pesquisadores também estão cultivando cafeeiros a partir de sementes obtidas de todo o mundo e enviando-os a outros países para experimentos em campo, para averiguar onde vão crescer bem. 
Em 2013, o Ministério da Agricultura da Guatemala distribuiu fungicida a pequenos produtores, embora muitos tenham dito que o produto chegou tarde demais ou em quantidade insuficiente. 
A verba disponível num fundo para fornecer crédito a juros baixos passou de US$ 28 milhões (R$ 61,9 milhões) para US$100 milhões (R$ 221 milhões), e a validade do fundo foi estendida até 2026. 
"Por sua qualidade, o café daqui ocupa uma posição como a dos vinhos na França", comentou o vice-ministro da Agricultura, José Sebastián Marcucci. 
"A maior parte vem de pequenos produtores. Espero que eles possam ser motivados", disse o representante do governo. 
Fungo devasta cafezais na Guatemala
ELISABETH MALKIN
DO "NEW YORK TIMES",
EM SAN LUCAS TOLIMÁN, NA GUATEMALA 
20/05/2014 02h00

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