Os preços das commodities agrícolas passarão a operar com mais volatilidade, mas dentro de patamares muito superiores ao registrado até a crise de 2008, segundo analistas consultados pelo DCI. Dan Glickman, ex-secretário do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês) do governo Bill Clinton (1995-2001) e membro do conselho de administração da Bolsa de Chicago, não acredita que as commodities possam um dia voltar a operar em uma faixa de preços menor dentro da qual oscilam hoje. "Podem cair um pouco, mas se olharmos para a demanda global, com a população crescendo no mundo em desenvolvimento, os preços vão ficar mais altos", assegura.
Os preços já vinham subindo gradualmente desde meados de 2003, mas a disparada ocorreu somente após o estouro da crise do subprime nos Estados Unidos. Desde o mês de setembro de 2007, quando houve a quebra do Lehman Brothers, até abril deste ano, o Índice de Preços das Commodities subiu 78,8%. Desde então, a volatilidade tem comandado esses preços, sensíveis tanto a variações internas como externas a esse mercado.
"Nós temos mais desastres naturais, instabilidades geopolíticas, climas cada vez mais instáveis e incertezas econômicas. Junto a esses fatores estão se aprofundando o crescimento da produção e do consumo", avalia Glickman em entrevista ao DCI. Ele assinala, ainda, que "a atual instabilidade política no Oriente Médio é um dos maiores direcionadores dos altos preços".
Steve Cachia, analista da Cerealpar, ressalta que os altos valores do Índice de Preços das Commodities, que em março do ano passado chegou a ultrapassar os 200 pontos, ou 140% do valor de setembro de 2007, não têm tido o efeito de deprimir a demanda. "A demanda é forte e vai continuar forte. Prova disso é que no ano passado, quando teve o repique de preços, a demanda não sofreu alteração. Os compradores lá fora não se amedrontaram", afirmou o especialista ao DCI.
Fome e autossuficiência
Esse novo patamar de preços teve consequências sociais drásticas. Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês), a fome no mundo passou de 923 milhões de pessoas em 2007 para 1 bilhão de pessoas em 2009. Em 2012, o número retrocedeu para 870 milhões, mas, destes, 850 milhões viviam em países em desenvolvimento.
Apesar da forte correlação da insegurança alimentar com a disparada dos preços, Glickman defende que "só há um remédio para os preços altos: preços altos". "Isso leva a mais produção e mais oferta, o que no futuro tende a levar a mais estabilidade", argumenta.
Para evitar que novas crises econômicas aprofundem a fome no mundo, o ex-secretário norte-americano diz que só há solução com a autossuficiência agrícola nos países pobres e em desenvolvimento. E, para financiar essa autossuficiência, ele já vê uma mudança de prioridades dentro do Banco Mundial. "Sempre se olhou para a agricultura de baixa produtividade. Isso está mudando."
Glickman indica que as parcerias público-privadas também têm sido importantes fornecedoras de recursos para países com baixo potencial de investimento. "Por meio da Fundação Bill e Melinda Gates e da Fundação Bill Clinton, o governo dos Estados Unidos investe em Malawi, na Tanzânia, no Quênia, na Etiópia e em outros países do leste da África. O Brasil mesmo investe muito em Angola, Moçambique", ressalta o ex-secretário.
Por outro lado, ele acredita que países que já são autossuficientes em alimentos podem perder esse posto, como é o caso de alguns Estados europeus. Para Glickman, nações como Itália, Espanha e França deverão voltar seus esforços para proteger suas economias e "tendem a ser mais protecionistas e adversas às tecnologias, como aos transgênicos". Com isso, tendem a se fortalecer países que já se estabeleceram como exportadoras de commodities, como Canadá e Argentina, além de Estados Unidos e também do Brasil, cita.
Steve Cachia ressalta que o lado positivo da alta das commodities foi a capitalização dos produtores, que investiram mais em tecnologia. Segundo o analista, o aumento de produtividade garantiu que os produtores ficassem menos dependentes da forte variação de preços.
Curto prazo
Se em 2012 a seca nos Estados Unidos colaborou para a elevação dos preços das commodities com a redução da oferta, neste ano o cenário é mais incerto. "Tudo vai depender do segundo semestre", diz Cachia. "O clima bom nos Estados Unidos pode favorecer uma safra cheia, com muita produção, e isso volta a recompor os estoques", afirma. Segundo o analista, os preços do milho estão mais suscetíveis ao volume da produção norte-americana do que os da soja.
Fonte: CNA-SENAR
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