Mais protecionista do que nunca, o mundo impõe ao novo diretor geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o diplomata brasileiro Roberto Azevêdo, que assume em setembro, o desafio de brigar com números alarmantes. Dados do relatório Global Trade Alert (GTA), aos quais O GLOBO teve acesso, mostram que os países jamais aplicaram tantas medidas restritivas ao comércio. Movimento semelhante havia sido feito logo após o início da crise financeira global, em 2008. Nos últimos 12 meses, a Rússia, que acaba de entrar para a OMC, foi, de longe, o país que mais se fechou, com 48 novas medidas restritivas. Em seguida, vem a combalida Argentina, com 28. O Brasil aparece na décima posição, com nove.
- O agravante é que, atualmente, os governos não admitem estar sendo protecionistas e tendem a esconder debaixo do tapete o que têm feito para se proteger - disse ao GLOBO Simon Evenett, responsável pelo GTA, um dos documentos mais respeitados pelo mundo, coordenado pelo Center for Economic Policy Research (CEPR), baseado em Londres.
Desde a eclosão da crise financeira, em 2008, a Rússia se mantém na liderança do protecionismo, com 269 novas barreiras estabelecidas, sendo seguida pela Argentina, com 214, e pela Índia, com 165. Acusado pelos países ricos de ser protecionista, o Brasil aplicou 120 medidas restritivas. O número é considerado alto, mas ainda está dentro da média dos maiores exportadores do mundo.
União Europeia aplica quase 3 mil barreiras
Na União Europeia (UE), região que votou em bloco contra o candidato brasileiro na eleição da OMC, todos os países aplicaram individualmente mais do que cem medidas. Juntas, as 27 nações adotaram quase 3 mil barreiras tarifárias ou não.
- O novo diretor geral da OMC terá de lidar não só com a Rodada de Doha (ciclo de negociações que visa a ampliar a abertura comercial em todo o mundo), mas também com a flagrante tendência protecionista dos países, o que é cada vez mais preocupante. Boa parte das medidas não respeita as regras da OMC - destacou Simon Evenett.
O GTA tem um "protecionômetro" on-line, uma espécie de taxímetro para calcular medidas e apontar os maiores protecionistas do mundo e as maiores vítimas do protecionismo alheio, quase em tempo real. A China tem sido o principal alvo de barreiras.
Evenett afirma que a crise está por trás do processo de fechamento dos países e alerta para mais restrições que devem surgir daqui por diante, tendo em vista que ainda não há uma solução definitiva para as turbulências financeiras, sobretudo na Europa, o que não facilita em nada o trabalho de Roberto Azevêdo, que, para renovar a desgastada imagem da OMC, terá de buscar acordos para derrubar barreiras pelo mundo todo.
Corrida contra o tempo na OMC
Não se sabe a equação que este embaixador conhecido por ser um eficiente formador de consensos vai ter de montar para lidar com estes números. Mas, na avaliação de especialistas, ele não tem muito tempo. Roberto Azevêdo, cuja escolha recebeu apoio maciço dos países em desenvolvimento, assume o novo posto no dia 1º de setembro e terá pouco mais de três meses para mostrar os primeiros resultados da nova OMC na grande reunião ministerial de Bali, na Indonésia, marcada para dezembro deste ano.
Na semana passada, em Londres, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), a francesa Christine Lagarde, defendeu o fim das barreiras protecionistas para acionar o crescimento a plena potência das economias. Ela citou dados da OMC para destacar que os países do G-20 (com os maiores Produtos Internos Brutos do mundo, incluindo mercados emergentes, como o Brasil) têm lançado mão de cerca de 200 novas medidas restritivas ao comércio por ano, o que mostraria o tamanho do esforço que tem que ser feito de agora em diante para estimular as trocas comerciais.
Fonte: CNA-SENAR
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